[Reportagem] Os 760 da nossa televisão

A 4 de Dezembro de 2007, o “Diário de Notícias” afirmava que “as televisões comerciais encontraram uma nova forma de gerar receitas. A fórmula nasceu em canais underground por satélite mas, aos poucos, foi conquistando os generalistas, um pouco por todo o mundo. Os controversos concursos call TV, alvo de duras críticas por parte de deputados britânicos, que os acusam de ser uma forma dissimulada de jogo, já chegaram ao nosso país.

Quando o Telefone Toca

Foi o começo de uma lucrativa forma de fazer televisão. Quem não se lembra das madrugadas com Liliana Aguiar ou Vanessa Palma e os seus “Quando o Telefone Toca” ou “Toca a Ganhar”? Ambos prometiam dinheiro, muito dinheiro, para quem ligasse e acertasse na resposta correcta. Contudo, muito antes destes programas que apelavam ao telespectador a ligar compulsivamente para ganhar dinheiro, já se usava o famoso “760” para fazer dinheiro, ora nos talk-shows das manhãs, ora no das tarde.  Mas é certo que há muito tempo que as chamadas de valor acrescentado são usadas na nossa televisão. Quem for do tempo do “0800” lembrar-se-a dos pais chamarem a atenção para que não ligassem para esse número.

Ao longo dos anos são inúmeros os programas onde estas chamadas de valor acrescentado fizeram sucesso para os cofres da televisão e também para as contas bancárias de alguns portugueses. Todavia os regulamentos destes programas provêem que não hajas vencedor e a legislação não permite que os prémios sejam em dinheiro, sendo este pago em cartão de crédito, ouro, viagens, carros, electrodomésticos, entre outros. A isto junta-se recentemente duas queixas que chegaram a Entidade Reguladores para a Comunicação Social: “A ERC informa que recebeu duas queixas relativamente a este tema, encontrando-se os processos em fase de instrução”, disse Joana Pizarro, chefe de gabinete do Conselho Regulador.

Com estas queixas e descobertas que se encontravam ocultas a ERC decidiu investigar. Esta investigação levou a que “RTP”, “SIC” e “TVI” criassem um acordo de auto regulação em relação aos concursos de chamada de valor acrescentado. Este acordo chegou a ERC e pode ler-se que “dá resposta a algumas preocupações já manifestadas pela própria ERC” e clarifica “alguma desinformação que se tem registado nesta matéria“. Carlos Magno, presidente deste entidade congratula-se pelo facto dos canais generalistas terem chegado a um acordo e acrescente: “Acho que as televisões perceberam que estavam a exagerar e a auto regulação é um sinal de bom senso”.

Este documento foi analisado  e aprovado pelos membros do conselho regulador. O mesmo entra em vigor hoje, dia 1 de Julho. As mudanças mais visíveis prendem-se com novos procedimentos sobre o número de vezes que o apresentador pode apelar a que o telespectador ligue, que agora só poderá ser de 5 vezes por hora. Esta regra são se aplica aos formatos de televisão de “Call TV”.

Outras mudanças significativas será o facto dos canais se comprometerem a usar uma sinalética nos programas que incluem este tipo de concursos e o esclarecimento do valor das chamadas e do IVA. Os prémios relativos a estes concursos apenas podem ser pagos em espécie (ouro, automóveis, cartões de débito pré-carregados,viagens, imóveis e vales de compra) e isso terá de ser explicado durante a promoção do mesmo.

Quanto ganham e quem ganha?

Não são só as pessoas que ganham ao ligar para estes concursos. As chamadas tem um preço de 0,60€ mais IVA. Daqui são 0,5€ para quem está a patrocinar a linha, mais 0,1€ para o operador e os 0,138€ extra são do IVA, o que dá os 0,738€. Os canais de TV ganham 0,5€ numa chamada que custa 0,74€. Por exemplo, a TVI a ganha entre 450 a 900 mil € por cada programa “Somos Portugal” e só em chamadas, quando o prémio pode chegar, no máximo aos 100 mil euros.

Em 2012, de acordo com o relatório de contas da “Media Capital”, a “TVI” fechou o ano com 33,4 milhões de euros de receitas de serviços multimédia, uma subida de 76,7% face aos números de 2011. Segundo o mesmo documento, estes valores estão relacionados com concursos e programas incluídos na grelha de programação dos meios de televisão difundidos pelo grupo. Entre estes estão formatos como “A Tua Cara Não me é Estranha” e “Casa dos Segredos”, onde os vencedores e os concorrentes expulsos são escolhidos através de voto telefónico dos telespectadores. Também a “SIC”  teve um crescimento de 17,7% neste tipo de receitas, atingindo os 19,9 milhões, em 2012. No relatório, lê-se que foi “das maiores facturações de sempre” e adianta que o crescimento é explicado “pelo sucesso verificado em acções especiais, como foi o caso do ‘Camião d’Ouro’, que assinalou os 20 anos da SIC, e pelo bom desempenho dos concurso dos programas de daytime [como ‘Querida Júlia’ e ‘Boa Tarde’]“. 

Para os telespectadores as probabilidades são melhores que as do Euromilhões e aproximam-se das do Joker, isto em programas de 4 horas Mas o pior é que quanto mais tempo a linha estiver aberta, piores são as probabilidades.

Fonte: ERC, Site RTP, SIC, TVI